São Paulo, 14 de abril de 2021.
O Hospital Universitário da USP tem por finalidade promover o ensino, a pesquisa e a extensão de serviços à comunidade, como explicitado em seu regimento interno já no Art 1º. Para tal, o mesmo documento define que o HU precisa “desenvolver atividades assistenciais de prevenção e tratamento da doença, bem como de proteção e recuperação da saúde” a toda a sua comunidade interna e à população da área geográfica referente ao Distrito de Saúde do Butantã.
É evidente que para cumprir com sua missão e objetivo, o HU necessita de recursos humanos e de infraestrutura dimensionados de acordo com a demanda da população a qual ele se compromete a atender. Caso contrário a população tende a sofrer com a desassistência e a equipe de saúde com sobrecarga de trabalho.
Desde 2014, a Reitoria adotou medidas alinhadas a uma pretensa preocupação com o equilíbrio de contas em um cenário de menor repasse de verbas do tesouro do estado, o que culminou com a resolução sobre os Parâmetros de Sustentabilidade Econômico-financeira da USP, definindo que “em cenário de déficit orçamentário, estando o nível de comprometimento das receitas com despesas de pessoal em patamar superior a 80%”, a USP deveria ficar impossibilitada de executar novos planos de contratação, dentre outras limitações (Resolução 7334 de 2017).
Essa política, que resultou no congelamento do quadro de funcionários próprios, aliada a planos de incentivo à demissão voluntária (PIDV), levou a uma situação de subdimensionamento de toda a estrutura universitária, com graves prejuízos para o ensino, pesquisa e extensão.
Voltando o olhar especificamente para o HU, de acordo com os Anuários Estatísticos da USP, o número de consultas médicas passou de 163.035 em 2013 para 79.058 em 2019 (uma redução de 51,5%). No mesmo período o número de leitos passou de 233 para 127 (diminuição de 45,5%).
Quanto ao número de funcionários, este sofreu redução de 495 funcionários entre 2013 e 2019 (redução de 26,7%) O quadro de funcionários próprios restante, ao longo desses quase 10 anos sem contratações permanentes, sofre envelhecimento e baixas por aposentadorias e problemas de saúde.
Diante da urgência da reversão do quadro, estudantes, associação de médicos, sindicato e coletivos da comunidade local uniram forças e garantiram a alocação de recursos extras no valor de R$48 milhões via ALESP em 2017 com ação no Ministério Público do estado. Entretanto, esse recurso nunca foi repassado para o HU, sendo utilizado para cobrir gastos previdenciários sem qualquer satisfação para a comunidade acadêmica e população.
Posteriormente, no ano de 2018 novos R$40 milhões foram conquistados, desta vez com obrigatoriedade de uso de 50% do valor para infra-estrutura e o restante para contratação de pessoal para reestruturar o quadro de funcionários do HU.
O atraso na execução dos contratos foi muito grande, havendo contratações apenas em caráter temporário de um ano em outubro de 2019. Sucedeu-se também uma enorme dificuldade de preenchimento das vagas pois as condições contratuais eram pouco atrativas devido à temporalidade curta dos mesmos associada à cláusula de duzentena que impede o funcionário de ser recontratado antes do prazo de 200 dias.
Em 2020, o agravamento ainda maior da situação imposta pelos desafios da pandemia do novo coronavírus levou à criação de um grupo de trabalho (GT-HU) que visava, além de um projeto de reestruturação do hospital como um todo, uma gestão eficiente da crise sanitária em curso.
Atualmente com a superlotação dos centros de referência para COVID-19, o Conselho Deliberativo do HU e a superintendência se viram obrigados a abrir as portas para o atendimento a pacientes infectados, mesmo com a Divisão de Clínica Médica (DCM) já sobrecarregada.
Foi proposto de forma unilateral pela superintendência do HU a terceirização de leitos de UTI. A impossibilidade legal desse tipo de contrato de serviço levou à proposta final, até o presente momento, da terceirização do gripário e do hospital dia, criado especificamente para a emergência sanitária.
A terceirização traz profunda insegurança, uma vez que contratos atrelados à produtividade e não a indicadores de desempenho, geram uma profunda precarização do serviço para fins de lucro, o que é por si só uma completa perversão do sentido do direito universal à saúde de qualidade.
Com base em todo o exposto, cabe profunda reflexão e a exigência de posicionamentos claros e bem definidos. Entendemos que toda boa gestão deve prezar por um equilíbrio de contas e que contingências muitas vezes são remédios amargos para tempos econômicos difíceis.
Entretanto, o Estado tem o dever de servir ao povo que o sustenta e o legitima. O excesso de zelo orçamentário, às custas da inviabilização do pleno exercício da finalidade do HU (ensino, pesquisa e extensão de serviços à comunidade) indicam um inconveniente excesso de corporativismo completamente alheio ao ideal do funcionalismo público de serviço à população.
Para além, a falta de transparência e morosidade com que as verbas extras garantidas por emendas estaduais foram utilizadas apontam para um projeto de desmonte organizado, cuja explicação não pode ser totalmente entendida com base nos compromissos orçamentários.
Portanto, como comunidade acadêmica e corpo discente, exigimos explicações e esclarecimentos da Reitoria e da superintendência do HU:
1- Onde, quando e como foram gastos a totalidade, e não parte, dos R$ 88 milhões de reais que deveriam ser destinados ao HU
2- Qual foi a razão da grande demora na execução das contratações que se iniciaram em 2019, já que, segundo o Conselho Deliberativo, os recursos já estavam disponíveis há meses?
3- Quais são, previamente, as condições de contrato emergencial de terceirização de serviço de assistência? Quais indicadores de desempenho para assistência de qualidade e compromisso com o ensino estão a ele atrelados?
4- Demandamos a elaboração de um estudo detalhado de impacto sobre a assistência à população do Butantã e sobre o ensino das políticas de restrição às contratações impostas pelos Parâmetros de Sustentabilidade Econômico-financeira
5- Demandamos a criação de um plano de comunicação claro da superintendência e da reitoria com os representantes da comunidade, discentes, docentes e funcionários.
6- Por fim, demandamos cumprimento de plano de reestruturação do HU que leve em conta sua finalidade definida em regimento interno, já pautado pelo Grupo de Trabalho (GT-HU).
Respeitosamente,
Gestão do Centro Acadêmico Oswaldo Cruz (CAOC) 2021.
Assinam também esse documento:
Centro Acadêmico Arnaldo Vieira de Carvalho - CAAVC (Cursos de Fonoaudiologia, Fisioterapia e Terapia Ocupacional da FMUSP) • Centro acadêmico Adriana Sparenberg- CAAS (Curso de Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto) • Centro Acadêmico de Farmácia e Bioquímica da USP- CAFB • Centro Acadêmico da Fisioterapia – CAFisio (Curso de Fisioterapia da USP Ribeirão Preto) • Centro Acadêmico XXV de janeiro- Cafousp (Curso de Odontologia da USP) • Grêmio David Capistrano (Curso de medicina da USP Bauru) • Centro Acadêmico Trinta e Um de Outubro - EEUSP (Curso de enfermagem da USP) • Associação dos Médicos Residentes da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo- AMERUSP • União Estadual dos Estudantes de São Paulo - UEE SP • União Nacional dos Estudantes- UNE • O Diretório Central dos Estudantes Alexandre Vannucchi Leme - DCE livre da USP • Coletivo Butantã na Luta -CBL • Associação dos Docentes da Universidade de São Paulo- ADUSP • Centro Acadêmico Emílio Ribas- CAER da FSP • Sindicato dos Médicos de São Paulo- SIMESP • Associação dos Moradores do CRUSP- AMORCRUSP • Centro Acadêmico João Cruz Costa (CAF) da USP • Centro Acadêmico Moacyr Rossi Nilsson- CAMRN • Centro Estudantil da Informática Biomédica- CEIB (Curso de Informática Biomédica da USP RP) • Centro Acadêmico Flaviana Condeixa Favaretto - CAFCF (Cursos de Economia, Administração e contabilidade da USP RP) • Centro Acadêmico Sócrates Brasileiro- CASB (Curso de Educação Física e Esporte da USP RP) • Centro Estudantil Josué de Castro- CEJOCA (Curso de Nutrição e Metabolismo da FMRP-USP) • Centro Estudantil de Fonoaudiologia da FMRP-USP - CEFono • Centro Acadêmico Marina de Andrade Rezende- CAMAR (Curso de Enfermagem da EERP/USP) • Centro Acadêmico XVII de Maio - FOB (Cursos de Odontologia e Fonoaudiologia da Faculdade de Odontologia de Bauru - USP) • Centro Acadêmico de Estudos Linguísticos e Literários Oswald de Andrade- CAELL (Curso de Letras da USP - FFLCH) • Sindicato dos Trabalhadores da USP- Sintusp • Comitê de Defesa do Hospital Sorocabana - CDHS • Associação de Engenharia Química- AEQ - Poli USP
Comments